Saberes y prácticas. Revista de Filosofía y Educación, ISSN 2525-2089

O programa da Residência Pedagógica e a importância da dimensão profissional para o ensino de Química

El programa de residencia pedagógica y la importancia de la dimensión profesional
para la enseñanza de la química

The Pedagogical Residency program and the importance of the professional dimension
for teaching Chemistry

Elane Chaveiro Soares

Instituto de Ciências Exatas e da Terra

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

ORCID https://orcid.org/0000-0003-0937-9187

 elaneufmt@gmail.com

 

Recibido: 09/05/2020

Aceptado: 02/03/2021

DOI:https://doi.org/10.48162/rev.36.007


Resumo. Aperfeiçoar a formação de professores de Química, por meio do desenvolvimento de projetos e ações que fortaleçam o campo da prática e conduzir o licenciando para o exercício reflexivo da relação entre teoria e prática profissional docente, foram os alvos do projeto da residência pedagógica em Química do curso de Licenciatura Plena em Química da Universidade Federal de Mato Grosso – Brasil, desenvolvido no período de agosto de 2018 a janeiro de 2020, com 24 residentes. Neste artigo, a partir de uma metodologia descritiva crítica, discutimos essa experiência com foco na possibilidade de se compreender a transformação da noção de processo formativo, tanto para o licenciando, quanto para a instituição formadora. A realidade profissional gritou suas necessidades e estas puderam ser discutidas e problematizadas a partir do programa da residência. A análise reflexiva de todo o processo aponta que o sucesso de uma formação inicial exitosa é conquistado por uma imersão mais profunda no ambiente profissional (na escola) e não necessariamente na vivencia acadêmica e teórica da universidade.

Palavras-chave. Formação docente, Residência Pedagógica, Ensino de Química.

Resumen. Mejorar la formación del profesorado de Química, a través del desarrollo de proyectos y acciones que fortalezcan el campo de la práctica y conduzcan al licenciatario al ejercicio reflexivo de la relación entre teoría y práctica profesional docente, fueron los objetivos del proyecto de residencia pedagógica en Química de la Curso de Grado Completo en Química en la Universidad Federal de Mato Grosso - Brasil, desarrollado desde agosto de 2018 hasta enero de 2020, con 24 residentes. En este artículo, con base en una metodología descriptiva crítica, discutimos esta experiencia con un enfoque en la posibilidad de comprender la transformación de la noción de proceso formativo, tanto para el licenciatario como para la institución formadora. La realidad profesional llamaba a sus necesidades y éstas podían ser discutidas y problematizadas desde el programa de residencia. El análisis reflexivo de todo el proceso señala que el éxito de una formación inicial exitosa se logra mediante una inmersión más profunda en el entorno profesional (en la escuela) y no necesariamente en la experiencia académica y teórica de la universidad.

Palabras clave. Formación del profesorado, Residencia pedagógica, Enseñanza de la Química.

Abstract. Improving the training of Chemistry teachers, through the development of projects and actions that strengthen the field of practice and leading the licensee to the reflective exercise of the relationship between theory and teaching professional practice, were the targets of the pedagogical residency project in Chemistry of the Full Degree course in Chemistry at the Federal University of Mato Grosso - Brazil, developed from August 2018 to January 2020, with 24 residents. In this article, based on a critical descriptive methodology, we discussed this experience with a focus on the possibility of understanding the transformation of the notion of training process, both for the licensee and for the training institution. The professional reality called out their needs and these could be discussed and problematized from the residency program. The reflexive analysis of the whole process points out that the success of a successful initial formation is achieved by a deeper immersion in the professional environment (at school) and not necessarily in the academic and theoretical experience of the university.

Keywords. Teacher training, Pedagogical Residence, Chemsitry Teaching.


Introdução


Neste artigo, a partir de uma metodologia descritiva crítica, dicutimos a participação de estudantes do curso de Licenciatura plena em Química da Universidade Federal de Mato Groso – Brasil no Programa de Residência Pedagógica (PRP), no primeiro edital da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Almejava-se, desde o inicio, a transformação da noção de processo formativo, tanto para o licenciando, quanto para a instituição formadora. Os fundamentos foram buscados na epistemologia da prática pedagógica e na perspectiva de um estágio supervisionado que resignificasse a relação entre teoria e prática, ampliando a visão de ensino, aprendizagem e de atuação profissional para estes futuros professores de Química.

Sobre esta experiência, destacamos inicialmente, alguns desafios, como a difícil seleção de, no minimo, 24 (vinte e quatro) estagiários como bolsistas e os conflitos experimentados na interação com a realidade escolar e mesmo no interior do grupo. É preciso, no entanto, destacar, também, os avanços provocados pela imersão intensa, sequencial e planejada na realidade escolar, o que nos permite apontar para a melhoria da formação inicial realizada a partir de condições estruturais, financeiras, conceituais e, até, emocionais, que cooperaram para a formação de profissionais mais críticos e ativos.

Pode-se afirmar que a participação no programa, promoveu a compreensão mais elaborada da formação docente, uma vez que permitiu a imersão continua e subsidiada de uma equipe fortemente entrelaçada por um planejamento de acompanhamento e intervenção que ser reuniam em grupos de trabalho e prestação de contas, bem como para compartilhar saberes advindos da prática realizada nos estágios.

Os cursos de licenciatura e bacharelado em Química, oferecidos pelo Departamento de Química da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), possuem entrada pelo sistema de seleção unificada (SISU) de maneira separada. Funcionam, desde sua implantação, em consonância com um núcleo comum para formação química. Em sua estrutura atual – aprovada e implementada desde 2010 – a Licenciatura Plena em Química (LPQ/UFMT) desenvolve 3620h divididas conforme o quadro 1.

Quadro 1: Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura Plena em Química/UFMT - 2010/1.

Fonte: UFMT (2009)
 

Quadro 1: Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura Plena em Química/UFMT - 2010/1.

É um curso que se mantêm nas entranhas de uma luta entre campos diferenciados de perfil e de atuação profissional (Bourdieu, P. 1989). O licenciando, preparando-se para a atuação docente e o bacharel, preparando-se para atuação na indústria. Muitos são os exemplos de conflitos internos que poderiam ser citados aqui, que a priori, tem a ver com a questão da pouca valorização do profissional de ensino, que tem o seu campo de atuação profissional desprestigiado em detrimento daquele que atua nos laboratórios das indústrias. No entanto, estaríamos fugindo ao objetivo do texto. Na rotina acadêmica, a condução formativa desses discentes é feita por um corpo docente diversificado que atende a base comum de química nos dois cursos e diferenciada pelos docentes que compõem a área de ensino de Química, onde são trabalhadas as disciplinas de: Instrumentações para o ensino de Química I e II, Tecnologias Educacionais para o ensino de Química, Projetos para o ensino de Química, História e Filosofia da Química e os Estágios Supervisionados I, II, III e IV. Bem como, pelos docentes de outros departamentos que ministram as disciplinas de Didática, Organização e Funcionamento da Educação Básica, Psicologia da aprendizagem e Psicologia da Educação, Libras e Inglês.

Em termos pedagógicos, pode-se afirmar que o aumento da carga horária para o estágio supervisionado e a implementação das práticas como componente curricular (PCC) – que juntos somam 840 horas – no caso do curso oferecido pela UFMT, provocaram, não apenas um aumento quantitativo, mas um reforço qualitativo na percepção e no enfrentamento dos desafios da profissão docente. Esta experiência ampliada, ainda durante a formação inicial, vem revelando a importância de alguns dos muitos aspectos que envolvem a docência, como a compreensão aperfeiçoada de qual seja o lugar da ciência na lida com o currículo e a cultura (Lopes, A. y Macedo, E. 2012); a percepção e do tratamento das crenças sobre como ensinar (Marcelo Garcia, C. 1999, 2009); o reconhecimento e consequente posicionamento do papel do professor frente ao conhecimento (Fichtner, B. 2012); a análise clara da relação e interação dos saberes iniciais com o trabalho docente e como essa evolução se dá a partir de uma rotina planejada (Tardif, M. 2010); a proposição de uma interlocução entre a realidade profissional e as teorias contemporâneas da educação (Bertrand, Y. 2001), além da necessidade de se aprender a lidar com aspectos práticos, teóricos e epistemológicos que influenciarão diretamente na competência profissional (Zabala, A. 2010), dentre outros tantos aspectos, necessários para a construção do conhecimento profissional docente (Montero, L. 2001) no âmbito do ensino das ciências.

Entretanto, como ocorre em quase todo o Brasil, a referida licenciatura sofre com a ideia de campo profissional menos valorizado. Algo que já foi mencionado anteriormente. Em tese, o ingressante das licenciaturas no Brasil ou não sabe o que significa ser um licenciado, ou entra nesta graduação com a intenção de conseguir uma transferência para outro curso logo que possível. Trabalhos que investigam essa questão, apontam a existência de diferentes fatores intervenientes no fenômeno da evasão dos cursos de licenciatura e que podem ser classificados em: econômicos, de desempenho, fatores sociais e de escolha do curso (Vitelli, R. 2014).

A LPQ/UFMT encontra-se em processo de reestruturação curricular, com previsão de implementação de uma nova estrutura. Esta ação é urgente, no entanto, vem sofrendo por conta da pandemia instaurada desde 2020 e com todos os desafios da docência por vias remotas.

A atual matriz curricular será reduzida, passando das atuais 3620h para 3200h, intentando-se, com isso, que o graduando se envolva mais com a pesquisa e com a extensão e, ainda, possa realizar o estágio em um dos períodos do dia (a preferência tem recaído para o matutino, por ser este, o período de funcionamento das escolas de educação básica no Brasil e em especial no Estado de Mato Grosso). Para que isso seja possível, alterações estão sendo pensadas a fim de que o curso seja distribuído em apenas um período do dia considerando a necessidade econômica dos ingressantes em relação ao mundo do trabalho e do estágio. As ementas não serão eliminadas e sim reorganizadas a fim de manter e/ou de melhorar a formação almejada para o egresso.


O Estágio Supervisionado e a Implementação do Projeto da Residência Pedagógica em Química


O estágio curricular supervisionado da LPQ/UFMT constitui-se em um espaço de aprendizagem concreta, de vivência prática do futuro professor de Química. O objetivo se direciona na aplicação de conhecimentos científicos, didáticos-pedagógicos e metodológicos, desenvolvidos durante a realização do curso na vivência profissional docente, conforme destaca o projeto do curso. Na atual estrutura, esse estágio tem uma duração mínima de 420h e é distribuído em disciplinas denominadas de Estágio Supervisionado I, II, III e IV. O estudante é acompanhado por um professor do curso (supervisor) e um professor da instituição escolar (regente), responsáveis pelo estágio que pode ser desenvolvido em quatro escolas diferentes ou mais, dependendo do contexto e do período do ano letivo.

A LPQ/UFMT se envolve com as questões relativas à formação docente, participando de todas as atividades e de programas, como os de monitoria, tutoria e do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), sendo esse último desde o seu início, quando a Capes lançou o seu primeiro edital. A área de ensino também promove, desde o ano de 2002, a realização da Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química (SEMIPEQ) enquanto projeto de extensão, acumulando ações que se configuram em entrelaçamento com a realidade escolar (SOARES, E., MELLO, I., RIBEIRO, M. y MORAES, M., 2014). Neste sentido, a experiência acumulada pelos professores da área de ensino de Química que orientaram no programa, permitiu a construção de uma proposta para a residência pedagógica de forma mais facilitada.

Assim, a Residência Pedagógica em Química (RPQ/UFMT) objetivou aperfeiçoar a formação dos licenciandos, por meio do desenvolvimento de projetos e ações que pudessem fortalecer o campo da prática, exercitando de forma ativa a relação entre teoria e prática profissional docente e utilizando atividades diversas sobre o ensino e a aprendizagem escolar, entre outras didáticas e metodologias. Buscou-se aprofundar o contato com o ambiente profissional de forma precoce e sistematizada e, assim, poder discutir o seu papel na educação básica, durante o processo de constituição acadêmica e profissional, de forma participativa, intencional, organizada e bem fundamentada, que promovesse maior articulação e/ou interlocução entre os âmbitos das atividades escolares e acadêmicas, para além daquilo que já se fazia nos estágios.

O projeto procurou unir mais fortemente as atividades de ensino, extensão e pesquisa na lida com as questões teóricas e práticas relacionadas ao ensino de Química. Assim, destacamos a seguir, as etapas do programa e discutimos os aprendizados relacionados à formação de professores que nos motivam a continuar e a repensar a docência para além da formação acadêmica.


A Aprovação do Projeto e a Seleção dos Bolsistas


A participação no Programa da RPQ requereu, do colegiado do curso da LPQ/UFMT, sua aprovação para o aproveitamento da carga horária total para os Estágios Supervisionados constantes na estrutura do curso (conforme Ata n. 06/2018). E, assim, em reunião no dia 07 de maio de 2018, a solicitação foi deferida, pois houve o entendimento de que a participação dos discentes no referido programa seria relevante e pertinente para a melhoria do estágio supervisionado, podendo promover inclusive, a potencialização da formação para a docência.

O colegiado entendeu que o programa deveria ser encarado como um desafio e uma renovação das perspectivas formativas para os futuros professores de Química e esta ideia foi assumida pela equipe responsável desde o início. Destacou-se também, a questão das bolsas que subsidiariam os estagiários e que esta questão deveria ser pensada para atendimento de todos os estagiários e não apenas para uma parte deles. 

Dessa forma, o projeto foi constituído, inicialmente, pela seleção e inclusão de 24 (vinte e quatro) bolsistas e 1 (um) voluntário e todos passaram por entrevista e análise do histórico acadêmico para que sua inclusão fosse efetuada. Este número (25) foi se alterando durante o desenvolvimento do programa, tendo em vista a manutenção mínima de 24 (vinte e quatro) bolsistas.

Como ocorreu em outras licenciaturas, tivemos certa dificuldade para conseguir selecionar o número obrigatório de estudantes para serem os bolsistas do programa. Muitos discentes, que já deveriam estar na etapa do estágio, possuíam, ainda, uma baixa carga horária do curso efetivada. Outros, que tinham condição para tal, estavam comprometidos com o Programa Institucional de Bolsas de iniciação científica (Pibic) e outros não poderiam se comprometer com o programa por conta de vínculo empregatício com alta carga horária de trabalho. Nesta dinâmica, a seleção ocorreu tendo em vista a aplicação de critérios mínimos que atendessem ao edital e que possibilitassem a constituição da equipe, com ajustes posteriores.

Dessa forma, entendendo que são necessários e importantes alguns pré-requisitos para a efetivação satisfatória do estágio profissional, levou-se adiante uma seleção não muito rigorosa, mas comprometida com ações que pudessem mitigar quaisquer dificuldades apresentadas pelos discentes no decorrer do estágio.


A Seleção dos Preceptores e das Escolas


Para esta seleção, os professores da rede pública de ensino foram informados, por meio da Secretaria Estadual de Educação e Cultura de Mato Grosso (SEDUC/MT), sobre o edital de vagas para preceptores. No caso da Química, foram disponibilizadas apenas 3 (três) vagas. Estes, portanto, deveriam se candidatar ao processo e indicar a disponibilidade para participar do programa.

Para a seleção dos preceptores, levamos em conta o edital, bem como o tamanho da escola (a partir de agora chamada de escola-campo) onde o professor estava alocado, uma vez que cada preceptor iria acompanhar 8 (oito) estagiários, um número considerado alto e difícil de dimensionar naquele momento. Isso nos levou a duas escolas centrais e tradicionais de Cuiabá-MT: a Escola Estadual Presidente Médici – que possui 38 salas de aula em funcionamento – na qual foram selecionadas duas preceptoras e distribuídos 8 (oito) estagiários para cada uma e a Escola Estadual Maria de Arruda Muller, mais conhecida como Liceu Cuiabano – que possui 15 salas de aula em funcionamento – que ficou com uma preceptora selecionada e com 9 (nove) estagiários.


Um Cronograma Para as Atividades


O cronograma sugerido pela Capes foi adaptado pelo projeto da LPQ/UFMT, de forma que as atividades seguiram o empenho de cada etapa, conforme destacado no quadro 2 a seguir.

Quadro 2: Cronograma de atividades proposto pela Capes em 2018.

Fonte: Adaptado do edital capes 1/2018.

Quadro 2: Cronograma de atividades proposto pela Capes em 2018.

A Preparação do Estudante para a Participação no Programa

Nesta etapa, composta por reuniões de trabalho, agendadas previamente e realizadas tanto no ambiente acadêmico, quanto na escola-campo, toda a equipe, composta por bolsistas, preceptores e orientador, se reuniu para compreender como se daria o funcionamento da RPQ/UFMT. O planejamento inicial foi discutido e melhorado, dúvidas e dificuldades foram levantas para que o início do programa fosse estabelecido e as professoras selecionadas foram preparadas no conjunto das reuniões e em encontros extras com a professora orientadora do programa. Ocorreu, também, a formação realizada pela coordenação institucional da UFMT através do ambiente virtual de aprendizagem (AVA). O detalhamento das atividades pode ser visualizado no quadro 3 a seguir.

Quadro 3: Detalhamento das atividades para a Preparação do aluno Residente. Fonte: Projeto da RPQ/UFMT – agosto de 2018 a janeiro de 2020.

Quadro 3: Detalhamento das atividades para a Preparação do aluno Residente. Fonte: Projeto da RPQ/UFMT – agosto de 2018 a janeiro de 2020.

Orientação Conjunta e Ambientação do Residente na Escola


A ambientação do residente na escola-campo ocorreu por visitas organizadas, a fim de se realizar um diagnóstico da escola. Objetivou-se conhecer a estrutura física e de gestão, o bairro onde a escola está localizada, sua história e suas ações junto à comunidade, bem como diagnosticar a forma e contexto de realização do ensino de Química na escola. Foi conjunta porque foi efetivamente um trabalho entre orientadora e preceptoras do programa na condução do planejamento para este momento.

Já tive a oportunidade de relatar em outro momento (Soares, E. 2012) o quanto a inserção nas escolas públicas de educação básica é um processo complexo e que demanda cautela, empatia e um planejamento sustentado por uma metodologia que permita a compreensão da epistemologia da prática docente desenvolvida naquele ambiente. Neste sentido, destaco o quanto é importante manter uma equipe coesa e comprometida com a formação para a docência. Ação que almejamos na preparação do plano de trabalho individual e descrito a seguir.


A Preparação do Plano de Trabalho Individual

De posse dos dados e realizada a análise crítica dos planejamentos, cada residente passou para a preparação do Plano de Atividade Individual (PTI), com vistas a uma compreensão aprofundada e uma possível intervenção na realidade escolar. Cada residente desenvolveu um projeto detalhado, contendo especificações para a utilização das 320h (período que foi de fevereiro a novembro de 2019).

Este foi um momento de muitas incertezas e ao mesmo tempo de muita coragem por parte de toda a equipe. Tínhamos muitas dúvidas sobre como fazer e resolvemos aprender com os erros e acertos a partir do compromisso de toda a equipe.


Avaliação e Constituição das Ações

Cada ação deveria ser planejada, realizada e avaliada subsequentemente. Dessa forma, atividades, como a participação em Feira de Ciências e/ou do Conhecimento, Projetos de extensão e Projetos de pesquisa relacionados ao Ensino de Química, dentre outras, possuíam a prerrogativa de realização no conjunto com a professora preceptora e os estudantes da escola-campo, a fim de se poder perceber, com maior profundidade, a interlocução entre os sujeitos e os ambientes e quanto cada uma das atividades foram capazes de transformar o conhecimento sobre a prática docente.


Atividades de Monitoria

A monitoria, desenvolvida pelo residente e orientada por cada uma das preceptoras, foi capaz de aprofundar conhecimentos teóricos e práticos necessários à formação do futuro profissional. Foram realizadas diversas ações, como simples acompanhamento das aulas teóricas e práticas enquanto apoio, aplicação de provas, aplicação de listas de exercícios, aplicação de jogos didáticos, revisão de conteúdo, apoio logísticos em feiras de ciências etc.


Abordagem Experimental

Foram preparadas e aplicadas algumas aulas com abordagem experimental e realizadas com o suporte e o apoio de um colega residente. Estas aulas experimentais contemplaram o planejamento das preceptoras e atenderam a objetivos de ensino e aprendizagem, visionados no currículo de Química desenvolvido pela escola e foram realizadas com bom aproveitamento, uma vez que nas duas escolas existem laboratórios razoavelmente bem estruturados e esta condição foi essencial para o bom êxito dessa etapa.


Abordagem Teórica

Enquanto passavam pela ambientação, pela monitoria e pelas instâncias de gestão e de atividades diversas no âmbito da escola, os residentes estavam, também, se preparando para o momento da regência.

Neste momento, de efetivação da docência, o residente se colocou na exposição de conteúdos e assumiu a dinâmica da sala de aula sob estreita observação, análise e reflexão crítica das preceptoras que acompanharam todo o desenvolvimento e atuação do residente. Assim, algumas intervenções foram necessárias quando as preceptoras percebiam fragilidades conceituais, metodológicas, didáticas e/ou epistemológicas.


Escrita do Relatório Final e a Socialização dos Resultados

A escrita do relatório final ocorreu no mês de dezembro de 2019 e foi um momento de reflexão e análise de todo o projeto, desenvolvido desde agosto de 2018 até aquele momento. Já a socialização, conforme o cronograma, deveria ser realizada em janeiro de 2020, no entanto, isso foi ocorrendo durante o ano, a partir de encontros entre as equipes.

De forma mais coletiva e formal, os residentes de todas as licenciaturas da universidade participaram, no período de 25 a 28 de novembro de 2019, da X Semana Acadêmica, XI Seminário Integrador PIBID, II Seminário Residência Pedagógica e o IX Seminário Tutoria. Este evento qualificou e divulgou as ações e os resultados dos trabalhos realizados no programa. Cada residente, no exercício da escrita acadêmica, elaborou e submeteu um artigo completo, focado em algum aspecto de sua participação no programa. Este artigo foi avaliado por uma comissão que designou os textos aprovados para serem apresentados como comunicação oral.


Resultados e Discussões


Como todo programa novo, a RPQ/UFMT envolveu a escola e a universidade em grandes expectativas. Em primeiro lugar, destaco a sensação de temor enfrentada por toda a equipe em relação à manutenção do núcleo, criado a partir da seleção dos integrantes. Havia o receio de que, se o número exato de 24 (vinte e quatro) bolsistas não se mantivesse, a qualquer momento todo o núcleo seria desfeito. Além disso, outro aspecto de tensão foi a constituição de um termo de compromisso que tornava obrigatória a devolução das bolsas recebidas, caso a descontinuidade no programa não fosse devidamente justificada e homologada pela Capes. De certa forma, estes aspectos, ainda que algumas vezes entendidos como negativos, foram fundamentais para reforçar a relevância do programa em termos de continuidade e seriedade.

Em segundo lugar, o alto número de estagiários para cada preceptor foi um grande desafio a ser enfrentado. Neste sentido, as preceptoras foram bastante profissionais e souberam trabalhar as dificuldades em termos de distribuição dos horários, na lida com as necessidades conceituais, de interpretação e interpessoais dos estagiários que acompanhavam.

Outra situação que gerou expectativa e que nos permitiu testar a flexibilidade do planejamento para a RPQ/UFMT foi a greve dos professores da rede pública, que ocorreu de 27 de maio a 11 de agosto de 2019. Essa decisão foi tomada pela maioria dos profissionais da educação em uma assembleia que ocorreu no auditório da Escola Estadual Presidente Médici (escola-campo da residência pedagógica em Química) em Cuiabá. Assim, no meio do caminho traçado havia uma greve educacional a ser vivenciada por estagiários em formação profissional. Uma situação que acabou servindo como possibilidade de aprendizado político, mesmo porque, com muita determinação, as atividades da residência pré-programadas foram, todas elas, realizadas sem que houvesse o comprometimento das etapas, pois as datas foram alteradas para que a programação educacional pudesse acontecer.

Sobre o desenvolvimento do PTI, destacamos a caracterização das realidades educacionais através de observações e diagnósticos, nos quais alguns residentes conseguiram aprofundar sua experiencia de estágio através da pesquisa (Chedin, E. et al. 2015; Arroyo, M. 2013). Vários trabalhos de conclusão de curso que utilizaram a RPQ/UFMT como ambiente preferencial para as pesquisas já estão disponíveis na coordenação do curso e podem ser consultadas (Silveira, I. 2019; Conceição, P. 2019; Santos, L. 2020; Leite, J. 2020; Nunes, K. 2020, Abe, S. 2021).

Os residentes realizaram, também, a leitura sistemática da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e participaram de palestras e rodas de conversa com professores do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Professores (Cefapro/MT) sobre a implementação desse documento. Além disso, leram e resenharam criticamente os livros de Bizzo (2002); Carvalho y Gil-Pérez (2011); Delizoicov (2007); Cachapuz et al. (2005).

Na extensão universitária, os residentes foram os protagonistas no desenvolvimento do projeto intitulado O disco de vinil como tema gerador para o ensino de Ciências. Nesta proposta, para subsidiar um minicurso de quatro horas, foi construído um caderno pedagógico (O vinil perdido e a ciência do biscoito negro) que contou com a colaboração de uma aluna da pós-graduação e mais dois alunos do curso de Licenciatura em Física da UFMT. Este material didático está em fase de revisão e editoração para publicação futura.

Destacamos, também, o envolvimento de muitos outros formadores junto à equipe da RPQ/UFMT. Todos estes forma convidados a participar das atividades junto aos residentes e, dentre os diversos temas tratados durante as reuniões de trabalho realizadas na universidade estão: Acessibilidade e inclusão para o ensino de ciências, ministrado pela mestranda do PPGECN, Suélen Estulano Marçal, nos dias 12, 19 e 26 de novembro de 2018; A experimentação no ensino de Química: um kit experimental para a extração de óleos essenciais na sala de aula, pelo Prof. Ms. João Augusto Valentim, no dia 3 de dezembro de 2018; Organização de atividades para Feiras Científicas escolares, desenvolvidas pela Prof. Ms. Fabia Elaine Ferreira de Melo e pela Prof. Ms. Jorci Ponce, nos dias 11 de fevereiro e 18 de março de 2019; Desenvolvendo projetos na escola, pela Prof. Ms. Ana Paula Albonette de Nóbrega, no dia 18 de fevereiro de 2019; A importância do desenvolvimento cognitivo para o ensino de ciências, pela Prof. Ms. Lydia Maria P. L. dos Santos, no dia 25 de março de 2019; O novo ensino médio e a área de ciências da natureza e suas tecnologias, com a Prof. Ms. Fabiula Costa Lopes, Prof. Dr. Isaltino Alves Barbosa e Prof. Ms. Sidnei Rogério Ferreira, no dia 10 de julho de 2019; Química Forense como temática para o ensino de Química, pelo mestrando Douglas Freitas de Oliveira, no dia 6 de novembro de 2019; O professor de Química como intérprete da História da construção do conhecimento, pela professora, autora do presente texto, nos dias 24 a 28 de junho de 2019.

Esta agenda de encontros na universidade e na escola, nos ajudou a compreender que as necessidades formativas devem ser tratadas no gerúndio, ou seja, na rotina dos estágios, com as ações escolares e acadêmicas trabalhando intensamente no cotidiano e não em momentos estanques ou distantes temporalmente. Tudo isso contribuiu para resignificar o processo formativo nos dando mesmo a sensação processual do percurso desenvolvido durante a residência pedagógica.


Considerações Finais


Como orientadora no programa da Residência Pedagógica em Química, posso destacar a necessidade e a importância de programas como esse no âmbito das instituições acadêmicas espalhadas pelo Brasil.

A princípio, a proposta foi entendida por alguns, como uma imposição da Política Nacional de Formação de Professores, mas seu objetivo, qual seja, o de “induzir o aperfeiçoamento da formação prática nos cursos de licenciatura, promovendo a imersão do licenciando na escola de educação básica, a partir da segunda metade de seu curso”, de forma subsidiada, ou seja, com apoio financeiro através de bolsas aos integrantes, enquanto aprofunda a ideia de imersão e acompanhamento sistemático do residente, foi, de certa forma, a cunha entre o que se fazia antes no desenvolvimento do estágio e o agora, pós experiência com a RPQ.

Após essa experiência, seguimos acreditando que é possível transformar a formação inicial de professores a partir do aprofundamento teórico, estrutural e epistemológico. Dentre os muitos aprendizados, destaco que a maior parte da carga horária do estágio, se não toda ela, precisa ser feita nas escolas e que os encontros na universidade são mais bem aproveitados quando a preceptora está presente no planejamento, no desenvolvimento e na avaliação de cada etapa. A realidade profissional foi quem gritou suas necessidades e estas foram tratadas, discutidas, teorizadas e problematizadas nos encontros, na medida em que foram aparecendo. Assim, não são, necessariamente, encontros semanais, quinzenais ou mensais que determinarão o bom andamento do estágio, mas, sim, o protagonismo para uma formação inicial exitosa, que, sob minha humilde perspectiva, está no ambiente profissional (na escola) e não necessariamente na universidade, que passa a ser o apoio teórico-metodológico de todo o processo.

A presença sistemática dos professores preceptores junto aos residentes pelo período contínuo de 18 meses, em uma mesma escola, permitiu a transformação da noção de processo de formação, não apenas para os residentes, mas também, para os próprios preceptores que puderam perceber a evolução prática, didática e conceitual, de cada um dos residentes. Acompanhar e atuar, de forma intencional e planejada, no contexto da escola básica, tornou-se uma ação mais clara, por conta de uma organização mais aprimorada de toda a vivência de estágio.

Saliento ainda, a necessidade de se protagonizar políticas de valorização que levem em conta a especificidade da formação docente enquanto profissional incumbido de formar outros profissionais e de, acima de tudo, contribuir para a estruturação de uma sociedade mais solidária e mais ética, porque mais humana.


Referencias


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